quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

La Gran Sabana

16, 17, 18, 19, 20 de janeiro

Apesar da cidadezinha ser pequena, demoramos para achar o hotel. A primeira impressão de Santa Elena do Uairén não foi boa (e também a segunda, terceira,...), mas, era um dos hotéis mais procurados para turismo, super bem localizado e ba-ra-tís-si-mo (BsF$ 250,00 ou R$ 8,00 a diária por pessoa!!!!!!), limpo, claro que sem café da manhã e, o mais interessante, cada um recebeu 1/3 de uma toalha de banho! Ficamos em dois quartos - um triplo (cujo chuveiro esquentava demais, então os 8 tomavam banho em 1 banheiro) e um quíntuplo. Sta Elena de Uairén fica no departamento de Bolívar, aliás, muitas coisas na Venezuela levam o nome deste ilustre filho de Caracas, que libertou vários países, inclusive o seu, da colonização espanhola.
A estrutura para o turismo ainda é precária, tem algumas operadoras. O clima em Sta Elena é muito quente durante o dia, agradável à tardinha e à noite. O câmbio é o seguinte: 1 dólar = 8 BsF e 1 real = 4,2 BsF, no paralelo. No câmbio oficial é quase a metade disso. Sta Elena não é nada charmosa, vive do turismo de aventura – especialmente gente que vem para a grande expedição de 1 semana para subir o Monte Roraima. Lembra cidades bolivianas ou peruanas, um tanto suja. A população basicamente indígena e, como se denominam os que não são indígenas, “criollos”. O Ricardo sempre se passava por local, mas os demais, as pessoas já sabiam que eram turistas. Muito carro caindo aos pedaços nas ruas, mas, também e especialmente, camionetões 4X4 bem novinhos, que é o que consegue trafegar nas estradinhas secundárias. Muitos brasileiros vem comprar coisas, especialmente contrabandear gasolina – incrivelmente barata (comum R$ 0,02, mas para os estrangeiros é mais “cara” – R$ 0,04!!!).
As duas primeiras refeições foram feitas quase em frente ao hotel num restaurantezinho bem arrumadinho, que nos pareceu o mais limpo da redondeza – comemos pizza, tomamos Seven UP, cervejas Polar (lata azul/light ou verde/mais forte) total de BsF 383,00. Antes do almoço, um venezuelano muito conversador que parecia ser um dos donos do restaurante, nos falou sobre as atrações locais, vendeu uns mapas bem bons da “Gran Sabana” e ofereceu um prato típico - sopa de peixe com pimenta, que é comido com um pãozinho duro, o  casabe ( lê-se cassabe - é pãozinho ázimo de mandioca brava, muito tradicional, com o que faz "tunga-tunga" na sopa e pega o peixe). Óbvio que quem provou foram os mais entusiasmados com as novidades, Ricardo e Cascata. O cara ainda os levou num supermercado para trocar dólares com o “pai” dele, que há meia hora antes ele disse ter falecido, mas, tudo bem, o câmbio era o melhor que se conseguia...
Nos reunimos com o Sr. Marrero para saber sobre os passeios e roteiros sugeridos, definir o que fazer a cada dia e também escolher a forma de ir até Canaíma, depois que visitássemos toda a Gran Sabana. O Sr. Roberto Marrero merece umas linhas - é uma pessoa culta e interessante: nasceu no mesmo dia da Luísa e da Bruna, tem uns 50 anos e veio morar em Sta Elena há mais ou menos 30 anos, quando a estrada que cruza toda a Gran Sabana foi aberta (a estrada foi feita para passar perto dos principais pontos turísticos). Dirige a Mystic Tours, tem livros e mapas publicados sobre a região – sobre turismo, geologia, história e, acreditem, a presença constante de OVNIs na Gran Sabana. Ele é entusiasmado por estes temas, já apareceu em muitas reportagens em meios de comunicação e, parece, muito respeitado, um dos melhores agentes de turismo da Gran Sabana. Se quiserem conhecê-lo, falando sobre estes assuntos, acessem o seguinte vídeo para ter uma ideia... http://www.wikio.es/video/venezuela---ovnis-805109 .Fechamos o pacote de tudo com ele, inclusive definindo a ida a Puerto Ordaz, de carro, para, a partir de lá pegarmos um aviãozinho até a Canaíma e ver o Salto Àngel (cachoeira mais alta do mundo, uma das maiores atrações da Venezuela).

  • Tour de 1 dia, carro para 9 pessoas (Toyota chassis largo) com guia/motorista – BsF 1.000,00
  • Viagem no mesmo Toyota, para os 8, com passeios no caminho até Pto Ordaz – BsF 2.400,00
  • Pacote Salto Ángel (voo Pto Ordaz/Canaíma/Pto Ordaz, com 2 noites de hospedagem mais alimentação) - BsF 2400,00 p/p
  • Voo Pto Ordaz/Caracas – BsF 370,00 p/p

Curiosidade: a Venezuela adotou um fuso diferente de todo o mundo – tem ½ hora de diferença para Roraima. Estávamos, então, com 2h30min a menos em relação ao horário de Brasília – o que o Sr. Chávez não faz...Ouvimos a piada que Sta Elena é o único lugar do mundo em que os brasileiros chegam antes dos britânicos nos encontros marcados, por não saberem disto, mas, a partir do 2º dia isto já deixa de acontecer. Nós, acostumados com o paralelo 30 e com horário de verão, agora estávamos num local em que às 18h30 era noite fechada e amanhecia às 5h. O negócio era aproveitar bem o dia. Todos os dias em Sta Elena tomávamos café em uma padaria muito boa, onde parece que a maioria dos turistas iam, já que os hotéis em geral não servem café. O atendimento era feito por uns tremendos mau humorados, mas tudo bem. Após o café, nós encontrávamos com nosso guia José, que ia dirigindo e falando sobre os locais visitados. Os bancos na Toyota não eram nada confortáveis, exceto para quem viajava ao lado do motorista.
Primeiro dia de turismo na Gran Sabana – vimos, de cara, a paisagem que dá nome ao lugar, lindas savanas, com buritizeiros, um ambiente totalmente preservado onde, no horizonte se visualiza os grandes “tepuis”, como são chamadas as montanhas que têm uma formação rochosa bem particular cujo topo é muito plano, dando a impressão de serem mesas. Ficaram mais famosos após servirem de inspiração para o cenário do longa de animação Up-Altas Aventuras, da Pixar e da Disney (para quem tem o DVD, vale a pena ver nos “extras” a expedição que os animadores da Disney fizeram a toda esta região, para se inspirar e desenhar os elementos do filme). O local inspirou também Artur Conan Doyle (o autor do Sherlock Holmes) a escrever o Mundo Perdido, em que os europeus desbravadores se perdem e descobrem um lugar com vegetação e animais pré-históricos. Muitos tepuis nunca foram sequer alcançados pelo homem. Os dois mais famosos deles e também mais acessíveis são o Monte Roraima e o Kukenan (com topo quase que completamente coberto por esculturas rochosas de mil e um formatos, dizem que muitas pessoas se perderam por lá sem deixar rastros – por isto, está proibida a subida ao Kukenan). Em cima do Monte Roraima fica o marco da divisa de fronteiras entre Brasil, Venezuela e Guiana (Inglesa). A Venezuela não reconhece mais da metade do território desta Guiana, este trecho é também chamado de Guiana Essequiba (em função do limite com o rio Essequibo) ou, na Venezuela, Zona em Disputa e apresenta uma extensão territorial de 159.500 km², cuja soberania é reclamada pela Venezuela internacionalmente por meio do Acordo de Genebra, de 17 de fevereiro de 1966.
Voltando à descrição do roteiro do 1º dia na região, depois de muito andar pelas savanas em estradas de chão e pegar um canoão dirigido por índios por 20 minutos, conhecemos o Salto Aponwao – 125m de muita água.
Neste salto, há uns 15 anos atrás, uma canoa apagou o motor e não conseguiu ligar mais, fazendo com que 18 pessoas, crianças na maioria, morressem na queda do barco. Coisa horrível de se ver segundo os índios. Por isto as canoas, hoje em dia, param a 1 km do Salto.
Os meninos (sim, todos os 4) jogaram um futebolzinho ao lado da casinha dos índios enquanto esperávamos que o barco viesse nos buscar. Almoçamos bem – um prato feito com galinha ao mel, ou “bife”, arroz e saladas, lá num restaurante bem rústico, próximo ao local da saída do barco. Fomos ainda ao Mirador Los 4 Ventos (lindíssima vista para os tepuis). “Descobrimos” o restaurante Venezuela Primero, que elegemos para todas as demais noites, bem pertinho do hotel e recomendado pelo José como o melhor da cidade, cardápio variado, preços de BsF 35,00 a 90,00.
No segundo dia de Gran Sabana, às 8h já de café tomado e com nosso excelente motorista e guia José, compramos bebidas e água e seguimos para os lados de Paují, que é um vilarejo hippie ao sul do parque, mas fora dele, no caminho para as vilas dos mineiros que fazem divisa com o Brasil. Os hippies foram para lá há alguns anos em busca de paz e tranquilidade; produzem mel, no final do ano fazem um fogueirão e provavelmente sentam ao redor para fumar unzinho... Pelas redondezas, minas de ouro, diamante, outros minérios e recém descobriram urânio. Nesta região vivem muitos foragidos, inclusive brasileiros, pela dificuldade de acesso. Conhecemos o Salto Catedral – água fria, mas num volume muito grande (isto que os rios estavam bem secos na região). Todos, exceto Mônica e Débora tomaram banho...(isto se repetiu inúmeras vezes). Num quiosquezinho bem arrumadinho tomamos chá gelado e licor de hibiscus, comemos geleia e até “vinho”, tudo de hibiscus, que lá chamam de malva. Depois fomos ao “abismo”, numa caminhada morro acima de 45min, de onde se enxerga muita selva amazônica, inclusive do Brasil, numa paisagem impressionante. Almoço com bisteca de porco defumada ou galinha e bananas carameladas. Muito bom. Depois, Poço Esmeralda, outra cachoeira bonita, água realmente verdinha e clara, transparente, justificando o nome. Os corajosos tomaram banho.
Terceiro dia de Gran Sabana – exploramos a estrada que cruza o parque. Tudo com excelente asfalto, com os pontos de interesse bem próximos da via: Quebrada de Jaspe (incrível, só vendo nas fotos para entender - rio passa sobre um leito de jaspe, uma pedra preciosa avermelhada, laranja e amarela; desta vez todos nos molhamos, o recomendado é andar pela cachoeira e todo o piso de jaspe com meias, pois resvala muito);
Salto Água Fria (após uma grande descida a pé, cercado de vegetação, muito bonito), ainda vimos o salto Kauí que o José considera o mais bonito, de frente para os tepuis, onde vimos arco-íris formados ao longe; almoço e artesanias em Yuruani (vila indígena à beira da estrada, artesanato em madeira, jaspe e também caulim, o Ricardo comeu um prato típico – pavillon criollo, que era uma carne desfiada com uns temperos, acompanhado de feijão, banana e arroz); Salto Suruape (cachoeiras grandes, bastante gente, muito jaspe no leito do rio, o banho pareceu muito bom, os guris inclusive saltavam de pedrões); Mirador “El Oso” (ao entardecer, linda vista da cadeia de tepuis, especialmente o Kukenan). Há poucos animais na savana: cobras (vimos 3 na estrada e 1 no mato), gaviões, “oso hormiguero” (que é o tamanduá), insetos e quase nada mais. No lugarejo onde almoçamos, conhecemos o cartógrafo Emilio Perez (por coincidência autor de todos os mapas que havíamos comprado!), uma pessoa muito simpática que faz muito trabalho de campo atualizando e fazendo mapas de várias partes deste grande parque. Ele conversou bastante com o Ricardo, contou que tem um irmão que mora em Caracas e que, entre outras coisas, tem organizado “tours sociais”, em que mostra a cidade e tenta explicar as grandes diferenças sociais existentes. Depois foi conosco até o Salto Suruape e ainda seguiu de carona conosco até um certo povoado. Já de volta ao Brasil, assistindo aos extras do desenho animado Up, ficamos surpresos ao ver uma foto do Emilio como um dos guias da equipe da Disney pelo Monte Roraima

As aulas começam na 2ª semana de janeiro e as férias longas são em agosto e setembro, então, não é alta temporada por aqui, em quase todos os lugares que íamos, estávamos sozinhos. Algo que é preciso comentar são as inúmeras barreiras policiais, militares, da guarda nacional e até indígenas onde sempre tivemos que parar, justificar algo. Em geral o José explicava que estava levando turistas e que retornaria à noite ou mostrava um papel em que tinha nossos nomes e documentos registrados. Os militares sempre muito guris, adolescentes, sérios e muito armados. Pelo jeito procuravam especialmente drogas. Abriam a porta traseira do carro para ver nossos rostos, espiavam por baixo dos bancos, vários nos pediram passaportes - tudo parecia somente para “constar”, já que apenas uma vez conferiram realmente os passaportes, mesmo assim, não olharam se as fotos dos passaportes conferiam conosco.
O Ricardo se tornou venezuelano na noite (ou “mais” venezuelano) – foi ao “centro” onde há várias tendas de comidas e lanches feitos na hora e comeu duas arepas – pãezinhos feitos com “harina Pan” – uma marca especial de farinha de mandioca. As arepas foram assadas (podem tb ser fritas ou na chapa) com recheio a escolher. Tomou frescolita (refrigerante típico fabricado pela Coca, com gosto de xarope gaseificado), tudo isto vendo uma partida de beisebol, que é o esporte nacional – estávamos em plena semana de decisões da Liga Venezuelana. O campeão vai para a Liga do Caribe. Em todos os restaurantes passavam partidas e o pessoal torcia. No centro de Sta Elena uma boate tocando música sertaneja e uma casa da “difícil vida fácil”, chamada Porto Belo, onde a maioria das trabalhadoras eram brasileiras, segundo o José, as preferidas pelos mineiros da região.
Quarto e último dia de Gran Sabana – parecia que já estávamos longe de casa há uns 15 dias, de tanta coisa que havíamos feito! Acordamos mais cedo um pouco, café na “panaderia” e às 7h45 saímos da Posada Michelle, após nos despedirmos do sr. Marrero e colocarmos todas as mochilas dentro da lona amarrada em cima do Toyota. O destino final deste dia seria Pueto Ordaz, uma cidade grande, distante 750km, com uma represa no rio Orenoco, onde moram os pais do José. Em função disto, penso que ele ficou feliz em ser contratado para nos levar. Estávamos tranquilos de ir com ele, pois numa viagem tão longa, com tantas barreiras policiais e a propaganda que nos haviam feito em relação à segurança... O dia não seria apenas de viagem – paramos em algumas atrações no caminho. Salto Kama ou Kama Teru - uma grande cachoeira, mas desta vez ninguém tomou banho, apenas visitamos os lugares. Cidade de Callao, maior cidade mineira da Venezuela, onde está uma grande mina estatal e, claro, tem um grande outdoor do Chávez na entrada. Nesta cidade visitamos uma mina de ouro desativada, as meninas da turma não se sentiram à vontade para entrar, já que havia “morcielegos”...pelas fotos, deve ter sido legal! Almoçamos cachapa (provavelmente o motivo do mal que atingiu a Mônica durante toda a noite seguinte!). A cachapa é uma panqueca feita na chapa com massa de milho e um pouco adocicada – parece pamonha – onde colocam o recheio que quiser, nós comemos com carne assada (muita gordura, por sinal) e um queijo mole – queso llanero! Vou dispensar os comentários a respeito das condições de higiene do local, que era na beira da estrada...
A estrada e a paisagem mudavam ao longo dos 750km, os povoados bastante pobres e feios. Nesta zona, os postos controlam a venda de combustível para não venderem a mineiros ilegais e as bombas são cuidados pelo exército. As pessoas usam uma cartela para carimbar o abastecimento, que só pode ser feito uma vez a cada 2 dias, exceto para carros de turismo como o nosso. Acontece que as pessoas fazem fila para lotar o tanque e vender o combustível aos mineiros com ágio e isto não é reprimido.

A população essencialmente indígena, todos “pemón”, a linguagem entre eles (da mesma etnia) é que pode variar, a ponto de nem se entenderem! Nós nos revezávamos nos bancos, sempre alguém deitando, pois não dava para espichar muito as pernas e sofríamos com as costas. Nunca houve acostamento, placas de sinalização eram raras, não há controle algum de velocidade, cintos não são exigidos e alguns poucos trechos tem faixas pintadas separando as pistas. José nos disse que muitos brasileiros se acidentam por não conhecer a estrada e tb pela falta de sinalização. Ele conhecia como a palma da mão. Se vê muito camionetão 4X4 novinho, especialmente Toyota, como o nosso, mas também alguns carros muito velhos, caindo aos pedaços. Na estrada, muitos carros brasileiros que vinham ou voltavam de Manaus para Isla Margarita – provavelmente a praia de mar mais próxima para eles, no total, uns 2.000 km!
Antes de entrar propriamente em Pto Ordáz, passamos por uma cidade periférica, chamada San Félix, que é muito grande e muuuuuito suja. Entrar em Pto Ordáz foi como entrar, pela primeira vez na Venezuela, em uma cidade limpa, com bairros chiques, condomínios fechados, parques, praças arborizadas, ruas bem largas, sinalizadas, centros comerciais e prédios altos. O que chama a atenção, em toda a Venezuela, desde o vilarejo mais pobre até esta grande cidade, é que não há porta ou janela, mesmo que seja no 10º andar, sem grades!!!
Em Pto Ordáz acontece o mesmo fenômeno que vimos em Manaus, do “encontro das águas” – desta vez, dos rios Caroni e do grande e famoso Orenoco. Diferentemente do Brasil, aqui as águas nunca se misturam, seguem, sempre, lado a lado, de cores diferentes, bem marcadas. No início da noite chegamos à Posada Kaori (sem café da manhã, muito limpa, “outro nível”, ar condicionado e internet!). Após um excelente banho fomos jantar no Centro Comercial Orinoquia, onde alguns provaram arepas, a maioria das crianças ficou feliz com o Mac Donalds e a Mônica nos humilhou com um waffle de chocolate. A noite de sono foi excelente, menos para a Mônica que botou todo o waffle e cachapa para fora e quase não dormiu...
Próximo post desta viagem
Apresentação de todas as fotos da Gran Sabana

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